terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

O TRABALHO ALIENADO

 
Consideramos até aqui a alienação, a espoliação do operário, só sob um aspecto, o de sua relação com os produtos de seu trabalho. Ora, a alienação não aparece somente no resultado, mas também no ato da produção, no interior da própria atividade produtora. Como o operário não seria estranho ao produto de sua atividade se, no próprio ato de produção, não se tornasse estranho a si mesmo? Com efeito, o produto é só o resumo da atividade de produção. Se o produto do trabalho é espoliação, a própria produção deve ser espoliação em ato, espoliação da atividade, atividade que espolia. A alienação do objeto do trabalho é só o resumo da alienação, da espoliação, na própria atividade do trabalho.
Ora em que consiste a espoliação do trabalho? Primeiro, no fato de que o trabalho é exterior ao operário, isto é, que não pertence ao seu ser; que, no seu trabalho, o operário não se afirma, mas se nega; que ele não se sente satisfeito aí, mas infeliz; que ele não desdobra aí uma livre energia física e intelectual, mas mortifica seu corpo e arruína seu espírito. É por isso que o operário não tem o sentimento de estar em si senão fora do trabalho; no trabalho, sente-se exterior a si mesmo. É ele quando não trabalha em, quando trabalha, não é ele. Seu trabalho não é voluntário, mas imposto. Trabalho forçado, não é a satisfação de uma necessidade, mas somente um meio de satisfazer necessidades fora do trabalho. A natureza alienada do trabalho aparece nitidamente no fato de que, desde que não exista imposição física ou outra, foge-se do trabalho como da peste. O trabalho alienado, o trabalho no qual o homem se espolia, é sacrifício de si, mortificação. Enfim, o operário ressente a natureza exterior do trabalho pelo fato de que não é seu bem próprio, mas o de outro, que não lhe pertence; que no trabalho o operário não pertence a si mesmo, mas a outro. Na religião, a atividade própria da imaginação, do cérebro, do coração humano, opera no indivíduo independentemente dele, isto é, como uma atividade estranha, divina ou diabólica. Do mesmo modo, a atividade do operário não é sua atividade própria; pertence a outro, é perda de si.
Chega-se então a esse resultado, que o homem (o operário) só tem espontaneidade nas suas funções animais: o comer, o beber e a procriação, talvez ainda na habitação, o adorno etc.; e que nas suas funções humanas, só sente a animalidade: o que é animal torna-se humano e o que é humano torna-se animal. Sem dúvida, comer, beber, procriar, etc., são também funções autenticamente humanas. Contudo, separadas do conjunto das atividades humanas, erigidas em fins últimos e exclusivos, não são mais que funções animais.

MARX, Ébauche d’une critique de l’economie politique .Bibliothèque de la Pléiade, Gallimard, toomo II pp. 60-61. (esboço de uma critica da economia política), Citado em: VV.AA. Os filósofos através dos textos. De Platão a Sartre. [tradução Constança Terezinha M. César] São Paulo: Paulus, 1997. p.250-251.

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